Saúde também depende das atividades corriqueiras do dia a dia
Você seguiu direitinho as recomendações do médico (e da Organização
Mundial de Saúde): 30 minutos de exercício físico por dia, de segunda a
sexta. Está satisfeito consigo mesmo, tem saúde garantida, correto? Não
completamente.
Um estudo novo da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) sugere que
uma pessoa que se exercita apenas nesses poucos minutos, mas passa o
resto do dia sentado ou realizando atividades que não demandam muito
movimento, tem as mesmas condições de saúde de alguém que não faz
exercício nenhum, mas fica zanzando de um lado para o outro o dia todo.
Até 10 anos atrás, a ciência se fixava somente nos benefícios do
tempo do exercício físico — aquele vôlei, futebol, academia, corrida e
caminhada, todos esportes de grande intensidade, mas que consomem
somente de 5% a 8% do tempo acordado de uma pessoa. O restante da boa
forma vem das atividades corriqueiras do dia a dia: cozinhar, passear
com o cachorro, se levantar da mesa do trabalho para pegar um cafezinho,
caminhar até a padaria para comprar pão etc.
Na última década, países como Austrália, Estados Unidos e Inglaterra
têm fixado sua atenção no que as pessoas fazem fora do horário de
praticar esportes. No Brasil, há alguns estudos que relatam o tempo que
adolescentes ficam na frente do computador, da televisão e do videogame,
mas ainda não havia um perfil completo de como as pessoas se movimentam
rotineiramente: deslocamentos, lazer, trabalho e estudo.
Em tese de mestrado, Grégore Mielke, pesquisador do comportamento
sedentário da UFPel, apresentou um estudo feito com quase 3 mil
moradores de Pelotas, mas que pode ser aplicado na população de outras
cidades de médio porte. Os resultados são surpreendentes: 10% dos
entrevistados passam 12 horas ou mais por dia sentados. E quanto mais
velha for a pessoa, menor será o comportamento sedentário.
O próprio conceito de sedentarismo muda:
— É possível que uma pessoa pratique muita atividade física, mas seja
sedentária. Se ela ficar sentada na maior parte do tempo, sem se
movimentar e só se exercitar meia hora por dia, pode ser considerada
sedentária. E isso pode se reverter em uma pior condição de saúde —
avalia Mielke.
Sedentarismo, portanto, significa se movimentar pouco durante o dia. E
outra coisa, bem diferente, é ser fisicamente ativo. Assim, Mielke
dividiu os entrevistados em quatro grupos:
1. Fisicamente ativos e não sedentários
2. Fisicamente ativos e sedentários
3. Fisicamente inativos e não sedentários
4. Fisicamente inativos e sedentários.
Os integrantes dos grupos 2 e 3 teriam os mesmos gastos energéticos
durante o dia. Mas antes de cancelar a academia, preste atenção ao que
diz Mielke:
— Eu gosto de fazer uma analogia: comer muita fruta ou verdura não
anula os efeitos de comer muita gordura. O que eu quero dizer com isso é
que os caminhos metabólicos para o gasto energético são diferentes e
não se deve abandonar nenhum hábito que seja saudável para o organismo. O
problema é que se tomou que 30 minutos de atividade física seriam uma
cápsula de saúde e a pessoa não precisaria fazer mais nada. E isso não é
verdade.
Haja fôlego
Morena Pinto Peters, 67 anos, é a legítima "não esquenta banco", segundo familiares. E ela concorda:
— Sento só um pouquinho para ver meu e-mail, mas no resto do dia estou voando.
E põe voando nisso: depois que se aposentou, a professora
universitária aproveitou o tempo livre para intensificar o esporte na
sua vida. Faz tênis, ioga e academia pelo menos três vezes por semana
cada. Achou muito? Que nada. Ela ainda tem fôlego para durante o dia ser
responsável por uma microempresa de biscoitos de alto teor de fibras,
cujas massas da receita e contabilidade ela faz do próprio punho.
Quando dá tempo, pega a bicicleta e vai dar uma volta na casa de
praia. Agora planeja ir com a magrela até sua chácara, em Morro Redondo,
distante 35 quilômetros da casa na cidade, em Pelotas. Por lá, ela
gosta de fazer trilhas no mato, mexer na terra e até plantar frutíferas.
Durante o dia, quando o tempo deixa, prefere andar a pé do que de
carro. A família fica contente com a disposição, e sempre que é
necessário ela ajuda a levar e buscar o neto de três anos na escolinha.
Está sempre inventando uma nova aventura:
— Agora quero ver se encaro Constantinopla — planeja.
Morena é exemplo de um caso praticamente perfeito dentro das
concepções do novo sedentarismo. Além de praticar esportes, seu dia a
dia é muito ativo, podendo ser considerada "fisicamente ativa e não
sedentária". Pois o ideal é a pessoa conseguir unir movimento de corpo
durante a rotina com exercício físico.
Vá pela escada
Ainda não há parâmetros que estipulem se as pessoas são "novas
sedentárias". Você pode medir se é fisicamente ativo ou não: faz
exercício físico diário por 30 minutos? E aí está sua resposta.
Mas no caso do novo significado de sedentarismo ainda não há medidas
para estipular se uma pessoa que fica de pé "x" horas ou se caminha até o
trabalho é ou não sedentária.
— O que queremos, com a pesquisa, é que as pessoas reavaliem sua
rotina. Que aqueles movimentos que eram desprezados, como usar a escada
em vez do elevador, caminhar até o trabalho, etc., sejam retomados.
Usando sempre o bom senso — afirma Mielke.
Segundo o pesquisador, alguns países estão tomando atitudes extremas,
como implantar alertas nas salas de aula para que os alunos fiquem de
pé durante alguns segundos e voltem a se sentar. Algumas empresas no
Exterior estão implantando mesas móveis que podem ser usadas pelo
funcionário em pé ou sentado.
A preocupação de ficar sentado tem base científica.
— É sabido que, quando uma pessoa fica mais de duas horas sentada,
uma enzima no corpo, responsável pela produção do colesterol bom, deixa
de trabalhar — explica o cientista.
Segundo o orientador do trabalho, o professor da UFPel Pedro Curi
Hallal, a tese dá subsídios para que a rotina das pessoas seja
transformada.
— Com esse perfil, temos potencial de intervir no trabalho e no
deslocamento das pessoas. Podemos sugerir pequenas mudanças que podem
acarretar em melhoria da saúde. Desde se levantar para falar com um
colega em vez de telefonar ou mandar e-mail até sugerir o uso de
bicicleta para chegar ao trabalho.
FONTE: BEM-ESTAR